4 de mai. de 2011

Boa noite


"Me chamo Paulo, tenho 50 anos. Não vou dormir em uma cama hoje."



"Não tenho mulher, filhos, casa. Mas não deixo que essas coisas me desanimem. O mundo está completamente do avesso, e eu não quero ser consumido pelo sistema. Não trabalho. Não do jeito que a maioria das pessoas trabalha, porque eu respeito nosso planeta. Todos somos parte de uma grande rede, mas ela está desgastada demais. Deus, se ele pudesse, sentiria pena de nós, mas ele é grandioso demais. Por isso vendo meus pensamentos. Esses são pensamentos inéditos, nunca publiquei...


Está chovendo forte demais hoje. Consequência do Aquecimento Global. Quando será que o homem vai entender que não se deve jogar lixo na rua? Por isso não tenho filhos nem como carne. O mundo está muito diferente do que já foi... Mas eu consigo ver o que está por detrás da máscara humana. Por isso não vejo televisão, ela envenena a gente. As grandes empresas manipulam tudo. Esse seu telefone, desculpe, mas não pude deixar de ver, ele pode informar pra eles onde você está e o que você compra. Eu vi na internet o último satélite que a NASA colocou em órbita. Está lá pra quem quiser ver! Pode fazer fotos da gente aqui, agora."

"Mas eu não desisto."



Paulo é mais um homem do Rio de Janeiro. Mas está longe de ser um cidadão. Aos olhos do estado é apenas mais um ser... Invisível. Naquela noite chuvosa, seu sapato encharcado não resistiria ao frio, muito menos suas roupas velhas. Seu estômago pediria por comida dali a horas, pois eu tinha lhe pagado um lanche. O cansaço de andar por aí vendendo seus pensamentos faria o corpo pesar, pedir por uma única pausa, mas onde? Ele teria de vigiar-se a cada instante. Calçadas ocupadas por moradores de rua. Lixo sendo revirado pelos bichos da noite. Ladrões de pensamentos em todos os lugares o espreitariam.

Paulo está sempre só, vagando, observando a vida. Sua cama, uma folha de jornal. Coberta? Nenhuma. Sua bolsa de mão seu travesseiro. Dormir? Por alguns minutos apenas. Sua confusão e lucidez se misturaram por diversas vezes. Não pude dormir tranquilo depois de conhecê-lo. Depois de lembrar que milhares de homens e mulheres invisíveis estão pelas ruas desamparados, sujeitos a todo tipo de circunstância.

Eternizemos então nossos Paulos. Porque se o que quer que seja o impede de ser o que é, eu deixarei abertas as portas do meu mundo.


"Os poderosos estão interessados apenas no próprio bolso enquanto muitos tantos estão com fome nas ruas. Por isso eu odeio política! Queria que eles morressem, mas nem conseguem prendê-los. Eles nos enganam, mas eu faço política o tempo todo, me entende? Eu sei disso, mas não voto nessa gente. Que Deus me perdoe, eu só quero ter o meu canto, ser gente de novo. Aqui dentro - apontando para o peito - Eu sou um Rei. E sei quem sou."

4 comentários:

  1. Nessas horas eu me pergunto: Ele é o louco por dizer estas palavras ou a gente por tentar esconde-las?

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  2. Infelizmente é essa a realidade em que vivemos e bem ou mal, felizmente, temos um cidadão como Senhor Paulo (o qual eu já tive a oportunidade de observar uma vez) que fazendo frio ou calor, ele está ali, vivendo. Existindo.

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  3. Bruninho, meu amigo. Vc sabe o quanto admiro vc como pessoa, como profissional e como ser pensador. Por conta disso tudo só tenho algo para lhe dizer: parabéns pela cara nova que deste ao seu blog. ;)

    Bj gd e continue produzindo. Faz bem para a gente, que lê, e para a alma.

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  4. Obrigado a vocês que postam suas opiniões por aqui! O espaço é pra isso mesmo!^^

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